sexta-feira, 18 de julho de 2014

EUA são único país desenvolvido que autoriza exploração de crianças a partir dos 12

ONG Human Rights Watch denunciou a exploração das crianças nos campos de tabaco norte-americanos, que trabalham até 60 horas por semana

Foto: Human Rights Watch
Por Salim Lamrani no Opera Mundi

Os Estados Unidos consideram prioritária a luta contra o tráfico de seres humanos. Segundo John F. Kerry, os Estados “têm uma obrigação moral de aceitar esse desafio já que o tráfico de seres humanos é um ataque contra nossos valores mais caros como a liberdade e a dignidade humana”. 1

Entretanto, o próprio relatório do Departamento de Estado é esmagador para Washington. De fato, os “EUA são fonte, trânsito e destino de homens, mulheres e crianças — tanto cidadãos estadunidenses quanto residentes estrangeiros — vítimas de tráfico sexual e trabalhos forçados”. 2

Segundo esse mesmo relatório,

Os meios de comunicação informaram sobre abusos dos quais foram vítimas indivíduos estrangeiros que trabalham para o exército estadunidense no Afeganistão. Várias ONGs reportaram que os detentores de visto que trabalham como serventes foram submetidos a trabalhos forçados pelos funcionários das missões diplomáticas e das organizações internacionais presentes nos Estados Unidos. Mulheres e meninas indo-americanas foram submetidas ao comercio sexual e a juventude LGBT tem sido particularmente vulnerável aos traficantes. 3

O relatório do Human Rights Watch

Por outro lado, os EUA são, sem dúvida, o único país desenvolvido onde as crianças podem ser exploradas no trabalho a partir dos 12 anos de idade. A Human Rigts Watch, organização de defesa dos direitos humanos, denunciou a exploração das crianças nos campos de tabaco. Segundo a entidade, elas têm em média 13 anos de idade e trabalham até 60 horas por semana.

Segundo uma investigação do HRW, 53% deles são expostas a pesticidas; 66% sofrem de sintomas recorrentes tais como “náuseas, vômitos, dores de cabeça, tonturas e perdas de apetite”, devido à exposição à nicotina; e 73% já estiveram doentes por “náuseas, dores de cabeça, enfermidades respiratórias, problemas de pele e outros sintomas”. 4

Segundo o HRW, as crianças “trabalham longas jornadas sem que sejam remuneradas pelas horas extras, sob um calor extremo, sem sombra ou pausas suficientes e sem proteção adequada”. Terminam “expostas a uma nicotina perigosa sem ter fumado um único cigarro”. As crianças também são obrigadas a manipular “ferramentas e máquinas perigosas, levantar cargas pesadas, escalar vários níveis sem proteção para pendurar o tabaco nas granjas”. 5

A organização acrescenta que “os tratores derramaram pesticidas perto das regiões de trabalho dos campos”, afetando gravemente a saúde das crianças, que ressaltaram que “o spray os alcançava diretamente, causando vômitos, tonturas e provocando dificuldades respiratórias e uma sensação de irritação nos olhos”. Além disso, a maioria dos pesticidas usados na produção de tabaco são “neurotóxicos notórios, venenos que alteram o sistema nervoso”.

Semelhante exposição pode provocar, no longo prazo, “câncer, problemas cognitivos e de aprendizagem e esterilidade”. O HRW ressalta que “as crianças são particularmente vulneráveis, já que seus corpos e cérebros ainda não terminaram de se desenvolver”. Por outro lado, “a maioria das crianças entrevistadas pelo Human Rights Watch declararam que não tinham tido acesso a banheiros ou a algum lugar para lavar as mãos nas áreas de trabalho, ficando com resíduos de tabaco e pesticidas nas mãos, inclusive durante os períodos de refeição”. 6

Vídeo feito pela HRW sobre plantações de tabaco:


 Em 2012, 70% das crianças com menos de 18 anos mortas em acidentes de trabalho eram trabalhadores agrícolas. O Código de Trabalho dos EUA não oferece proteção suficiente. Assim, as crianças podem ser exploradas na agricultura a partir dos 12 anos e trabalhar “por longas horas, com um salário inferior, em condições mais perigosas que qualquer outra indústria”.

A inclusão de Cuba na lista dos países envolvidos no tráfico de seres humanos parece estar mais motivada por considerações políticas e ideológicas que por uma base factual precisa e verificável. De fato, as organizações internacionais, particularmente as encarregadas da proteção da infância, como o UNICEF, contradizem as afirmações da Washington em relação à exploração de menores. Ao contrário, louvam a política social a favor da proteção das pessoas na ilha do Caribe.

Por outro lado, os Estados Unidos, centro do tráfico dos seres humanos segundo o Departamento do Estado, é o único país desenvolvido que autoriza a exploração de crianças a partir dos 12 anos, o que joga assim uma sombra em sua credibilidade quando se trata da defesa dos direitos humanos.

Notas:

1. Le Monde, "Le rapport américain sur la traite d’humains provoque un tollé", 20 de junho de 2013.

2. State Department, "Trafficking in Persons Report 2014", junho de 2014. http://www.state.gov/documents/organization/226849.pdf (site consultado em 30 de junho de 2014), p. 30-36.

3. Ibid.

4. Human Rights Watch, "US: Child Workers in Danger on Tobacco Farms", 14 de mayo de 2014. http://www.hrw.org/news/2014/05/14/us-child-workers-danger-tobacco-farms#infographic (site consultado el 30 de junio de 2014).

5. Ibid.

6. Ibid.

Salim Lamrani é Doutor em Estudos Ibéricos e Latino-americanos, é professor-titular da Universidade de la Reunión e jornalista, especialista nas relações entre Cuba e Estados Unidos. Seu último livro se chama Cuba. Les médias face au défi de l’impartialité, Paris, Editions Estrella, 2013, com prólogo de Eduardo Galeano.

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